Fausto Ferreira
5 Outubro 2011

Começou na noite passada a 10ª edição do Festival O Gesto Orelhudo, marcada por uma série de estreias, a começar pelo espaço. A Antiga Junta dos Vinhos, junto ao Rio Águeda numa zona requalificada, foi o local escolhido para acolher esta edição do festival que começou em 1999. Espaço este que estava muito bem decorado com o material “da casa” (barris, máquinas agrícolas, etc) e com uma excelente iluminação, principalmente na zona do bar/DJ. A 1ª noite foi também de estreias ao nível da programação com a Companhia dos Palhaços a dar um Concerto em Ri Maior. Mas antes um regresso aclamado de Bernard Massuir, esse mago da voz que passa pelo Bobby McFerrin europeu.

Bernard Massuir © Léa López

Pela 4ª vez em Águeda, trouxe tantos fãs e estreantes que as cadeiras foram poucas e a sala encheu facilmente com muita gente a ficar em pé. Começou por cumprimentar o público em português com um "boa noite", mas essas não foram as únicas palavras em português que sabia pronunciar. À 2ª música, já o público estava rendido a bater palmas e a interagir com este artista, que além de um bom músico é um grande comunicador. "Obrigadinho" era a resposta às palmas e eis que dá uma explicação longa em bom português sobre a música seguinte. Começa então a fazer algo que repetiu durante o espectáculo com sucesso: canta o motivo base da música inicialmente, gravando-o e usando essa gravação para improvisar por cima. Para complicar ainda mais, gravou também a 2ª improvisação e fez uma terceira voz por cima das duas gravadas anteriormente. À 4ª canção, teve de usar o francês e aconselhar o público a pedir ao vizinho a tradução para explicar o uso do acordeão-baixo nesta música dedicada a Erik Satie. Depois, veio Un Peu de Tout, o êxito da noite repetido no encore. Provavelmente, pelo refrão orelhudo que o público entoava e acompanhava com palmas. Houve ainda espaço para músicas acompanhadas com uma espécie de cavaquinho, uma delas dedicada às vítimas do furacão Katrina. Ou para uma fabulosa interpretação de Carmen de Bizet, com a ajuda do público nos graves. E para He always smilled de Chet Baker, uma boa definição deste músico que nos contagia facilmente pela sua boa disposição. Para a despedida, Valse au lit, uma canção de embalar. Mas o público queria mais e além da repetição de Un Peu de Tout, o final veio com o público em êxtase a acompanhar com palmas toda a última música. Seguramente, um grande início de festival.

Companhia dos Palhaços © André Brandão

Depois do intervalo, algo mais divertido e menos virtuoso musicalmente. A Companhia dos Palhaços vinda do sul do Brasil entrou em palco. Aliás, entrou apenas um dos palhaços e pediu a ajuda do público para chamar Wilson, o palhaço maestro russo que não falava obviamente a nossa língua. Sarrafo, o primeiro palhaço fazia a tradução do maestro Wilson que para palhaço sorria pouco, o que nos fazia rir ainda mais. Talvez por isso tenha sido engraçado ver palhaços a tocarem uma marcha fúnebre até interromperem e começarem então com “Oh! Susanna” música bem conhecida a lembrar o faroeste. Mas para isto precisaram da ajuda do público, pois o maestro tocava guitarra e harmónica (também conhecida por gaita de beiços) e precisava de alguém “para lhe segurar na gaita” [sic]. Depois de uma apurada e divertida escolha e do membro do público ter desempenhado a sua função com louvor, a Companhia dedicou-lhe um momento solene com o hino nacional a ser tocado. O problema é que era o do Brasil e como tal o designado ajudante não o sabia cantar. Ainda dedicado a este forçado voluntário foi uma balada com o nome de The Biggest Tonight. Na cena seguinte, um pequenino acordeão supostamente usado pelo avô do maestro no naufrágio do Titanic foi usado para recriar a cena de Jack e Rose. Com mais uma ajuda do público, com alguns membros da plateia a fazerem de icebergue e outro membro do público no palco a empurrar Sarrafo para simular o vento. Desta vez, o ajudante sofreu mais, pois teve de cantar a solo e dançar com Sarrafo. Por cima, mereceu a dedicatória do Bolero de Ravel. Houve ainda tempo para algo que não é novidade, mas que faz sempre rir. Um abraço entre palhaços com um a tocar o acordeão que o outro tem atrás das costas. E para um flamenco acompanhado a rigor por Sarrafo, vestido com uma saia vermelha e tocando castanholas. O vestido manteve-se mesmo para as cenas de malabarismo. Quando passamos de 3 para 4 bolas de malabarismo, Sarrafo emociona-se e pede a Wilson uma música adequada. Wilson toca More than Words chorando baba e ranho e Sarrafo não consegue concentrar-se no malabarismo, mas o público solta largas gargalhadas. O final foi apoteótico com o público aos saltos e a uivar tal como Sarrafo tinha pedido. Sem dúvida, uma boa maneira de acabar a noite.
Para o after-hours, o DJ Johny Red animou as hostes e nem o frio ribeirinho afastou os presentes durante largas horas.

DJ Johnny Red © André Brandão